domingo, 21 de agosto de 2011

Haicais

(são muitos e muito aleatórios, mas lá vai...)

Preguiça de verão
Lilú, dorme mimosa
Gata obesa

Tardes de outono
O tempo vai passando
E eu fico aqui

Os olhos verdes
Dentro do armário
Ronronando

Sombras aladas
Nos prédios cinzentos
Pássaros verdes

Riscos no céu
Parecem véus de noiva
Fumaça de avião

Casaco de pai
Um abraço é o que peço
Sol morno na pele

Cedo pra dizer
Sentimentos confusos
Será amor?

Encontrei quem me...
Entenda? Não sei dizer
Felicidade

(e ainda são ruins, puta merda...)

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Desatolei o meu arquivo de textos (horríveis e velhos) do iPod.

É, quando não acho papel e caneta, vai no iPod mesmo.
Eu odeio festas. Tanta gente, ouvindo as mesmas músicas ruins, de ritmo massante e repetitivo, sem melodia. Tanta gente, comendo os mesmos petiscos, todos com o mesmo gosto de nada. Tanta gente, e eu. Como faço para me sentir tão só no meio de tanta gente? Um vizinho (ou vizinha, vai saber) está dando uma festa, daquelas com "F" maiúsculo. Ouço várias vozes, de gente que conversa, ri, bebe, beija, e tantas outras coisas. Ouço o álcool em todas elas. Mas nesse mar de doses, drinques e taças, ouço uma ligeiramente mais lúcida, melodiosa. Diferente das outras. Dá pra sentir o bate-estaca ressoando na minha caixa toráxica. Alguém liga um microfone perto da voz-ilha no meio das ondas de embruaguez. Agora ouço também cordas, vibrando na ponta dos dedos do náufrago, que canta. É uma melodia conhecida, mas ainda não sei nomeá-la. Passam-se algumas notas, e descubro: "Por Você". Sorrio. Algo diferente dos salgadinhos e das pessoas, da velha conhecida solidão passa pela minha cabeça. Todos pensam em alguém quando ouvem músicas românticas. Eu só queria ter em quem pensar.
As gotas caem, pesadas e rápidas. Estalos constantes e desiguais nas janelas. Não chove. Só eu posso ouvir esse ritmo descompassado. Não é àgua o que despenca em cima de mim. Meus pensamentos se anevoaram e agora fazem chover. Tanta confusão.
Meus dedos pelos seus cabelos, os seus pelos meus. E na nuca, pescoço, costas, braços... E, muito tímidamente, na minha cintura, me fazendo sorrir mais forte, arrepiar. Aulas de história. Lições jamais aprendidas. Mas, deveras! Nossas mãos pareciam ter imãs. Seus dedos contornando os meus, se entrelaçando. Bons filmes antigos, desconhecidos ou clássicos muito bem escolhidos. Pencas de bons livros, autores. A biblioteca pública. Cruzar contigo ao entrar na locadora, cumprimentar-te, encabulada. Não achar palavras. Ver-te dobrar a esquina, acenando. BAM, tudo o que podia ter dito me vem à mente. Uma enxurrada de xingamentos murmurados, voltando para o meio das prateleiras, o olhar vago e o pensamento distante. Ver-te voltar. Minutos passam em segundos, em meio à sugestões, surpresas e identificações. A vontade de  guardar todos os detalhes. Saudades de momentos que jamais aconteceram. Meus lábios nos seus, conversas de intermináveis, notar um detalhe do mundo e sorrir, rir com você, dormir ao seu lado... E deixo minha imaginação vagar, virar sonho e, madrugada adentro tornar-se vontade. Os olhos me pesam agora. A tempestade já passou, abram as janelas e deixem os raios de  sol entrar, trazer a felicidade que é desejar. A brisa traz teu nome. Diz de novo, brisa! Deixa essa ser minha canção de ninar...

Vermelho

Andava na rua, a menina dos cabelos cor de rubi, um livro nas mãos - A Garota Das Laranjas, por Jostein Gaarder -, saindo de uma biblioteca pública qualquer. Procurava, sem prestar muita atenção, por seu marcador. Puxou uma rosa da bolsa, no lugar do marcador que procurava. Riu sozinha, sentindo os espinhos na palma da mão. De repente, viu uma mão atrás dela puxar a rosa. Virou-se e viu olhos de diamante que sorriam para ela. A rosa foi pousada com delicadeza entre as páginas que a garota segurava abertas. Ela observou, sorrindo. Fechou e guardou o livro cuidadosamente. Mas, ao levantar o olhar, o garoto dos olhos de diamante não estava mais lá. O sorriso se apagou de seu rosto e ela voltou a andar, rápida.
Chegou em casa, irrompendo pela porta adentro, os olhos úmidos. Apoiou as costas sobre a porta e escorreu junto com as lágrimas sobre suas bochechas, até se sentar sobre o assoalho, o rosto coberto pelas mãos trêmulas. Soluçava. Tempo se passou, é impossível dizer quanto, e ela levantou o rosto, apertou os olhos. Queria que as lágrimas que insistiam em fugir de seus olhos fossem impedidas. Algo muito macio e perfumado tocou seu nariz. Ela abriu os olhos, num sobressalto. Os olhos de diamante sorriam ao brincar de contornar seu rosto, com uma rosa tão vermelha quantos seus cabelos.
E ao ver o pintor - cantarolando canções sobre a vida - passar a tinta sobre um rabisco no muro ("mais amor, por favor!", dizia) é que sinto o amor se espalhar pelo meu corpo. As bochechas quentes. Sorrio. Não entendo mais nada, mas sinto-me feliz. Sente-te feliz ao pensar em mim...? E o rabisco não existe mais, foi coberto pela tinta. Mas o amor em mim permanece. E será amor? Uma paixão que passará? Não, não entendo... Mas sinto-me feliz. Mas é cedo demais. Cedo demais.
Em pouco tempo, o sol nascerá. A noite então terei atravessado, enquanto ela me atravessou de medo. Tem gente em todos os lugares. Todos me encaram, esperam o momento em que adormecerei. Aperto forte as mãos que me mantém presa a esse mundo, essa vida. Nem isso adianta. O medo já me domina. Não vejo como melhorar a situação. Sinto calor, mas temo descobrir-me, estarei desprotegida se o fizer. Levanto, entendendo que cheguei a meu limite. Minha visão enevoada, afinal fazia sentido: meus olhos agora fazem chover. É difícil manter os olhos abertos, lutar contra o sono. Mas o sol já nascerá, apagará meus medos, despertará alguém querido. A necessidade de checar, a todo momento, se há alguém aqui. Nunca avisto ninguém, mas permaneço convencida de que há, sim. Se fechar os olhos agora, dormirei. Mas não, acordada devo ficar.
Tinha gosto de morango, era quente como abraço e tinha cheiro de torta. Mas os morangos apodreceram, esquecidos na fruteira da sala-de-estar. Os abraços esfriaram à brisa fria, no parque já deserto. A torta na janela acabou, comida ás pressas por duas crianças que se diziam um casal. Nunca mais se viram as crianças. Cresceram. Jamais se lembraram os adultos. Mas algum dia o rapaz passará pelas estradinhas do parque, aquelas banhadas de alaranjados e mornos raios de sol. Aquelas cujas folhas enterram no chão de terra lembranças de abraços que esfriaram ao sabor da brisa, num outono qualquer. Mas algum dia a garota se afundará na poltrona da sala-de-estar, aquela ao lado da mesinha enfeitada com uma fruteira vazia. Aquela que tem manchas de sangue, espremido por mãos uma vez pequenas de dentro de pequenos morangos silvestres, ignorados pelos então infantis lábios por trazerem lembranças amargas de tempos que ainda viriam. E quando os adultos perceberem tais lembranças jamais recordadas, a nostalgia os pegará de surpresa. Serão então gente-grande na cozinha, cada um preparando uma torta de amoras, a qual comerão apressados, com vontade de beijos com gosto de morango; de abraços quentes de sol dourado; de pescoços, cabelos, corpos com cheiro de torta. E quando os lábios já crescidos provarem a torta, as bochechas um dia vermelhas e lisas provarão lágrimas quentes e salgadas, rolando sobre as rugas provocadas por sorrisos que os lábios já secos e pálidos jamias deram.

Perseverança (primeira parte)

  Sentar-se sobre o banquinho, ajeitar os livros abaixo dos pés; abrir o piano, descobrindo as teclas; abrir o caderno de partituras, colocá-lo no suporte. Toda esta meticulosa arrumação para apoiar os longos dedos magros sobre as teclas frias: e só. Nenhum som. Nenhuma vontade. "Nenhum erro", pensava.
  Até que, diante do silêncio, aparecia a mãe: "Mas porque não tocas? Tens que praticar!" e não obtinha resposta... "Toca!", gritava. Num sobressalto, a criança começou a tocar.
  Os acordes soavam bem, a melodia fluía, até que... "pléinnn". Uma nota errada acabava com a magia. E quem tocava voltava a pousar os dedos nas teclas, ficar inérte.
  "Que houve? Volta a tocar! Foi apenas um deslize, continue! Eu desisto... Apenas espere o Davide..."e bateu a porta às suas costas. A criança encolheu-se sobre o banquinho, abraçando os joelhos nús. Chorava.
  Ao ouvir a voz do professor que cumprimentava a mãe, susto. Pisando nas teclas, se empoleirando na tampa do piano-de-armário. Esperou por alguns segundos o som da maçaneta girando, enquanto ouvia o eco do lamento das teclas a pouco pisadas.
  "Konstantine?" chamou a voz grave e doce do professor. Olhava envolta, como se não tivesse visto a figurinha com os longos cabelos vermelhos despenteados encolhida em cima do piano. "Bom, parece que ela não está aqui..." e começou a tocar. Era como se ele e o piano fossem uma coisa só.

(não terminei de digitar, depois posto o resto.)